Gever Tulley só tem uma qualificação para treinar criadores de software a fim de torná-los mais criativos: ele ensina crianças a construir objetos como montanhas-russas acionadas pela gravidade, sem o uso de ferramentas, na Tinkering School, de Montara, Califórnia.
Agora, Tulley faz a mesma coisa com dezenas de adultos que ocupam posições de destaque na criação de software para a Adobe, uma grande produtora de software de San Jose, Califórnia. Em oficinas de um dia de duração, cerca de 100 programadores da Adobe trabalham com contas plásticas, pequenas telas eletrônicas, copos de água da Ikea e pequenos sensores, com o objetivo de criar jogos que usam formas estranhas de movimento. Geralmente, a única coisa que essas pessoas tocam, em seu trabalho, é o mouse do computador.
"Algumas pessoas viram essa idéia como loucura de nossa parte", diz Michael Gough, vice-presidente de projeto da Adobe. "Mas, para alguns outros participantes, a experiência começou a influenciar a maneira pela qual eles trabalham", dando-lhes uma melhor apreciação da maneira pela qual os usuários experimentam os programas da Adobe.
"Por isso, vamos continuar levando essa idéia em frente", acrescentou. A transformação promovida por Tulley coloca em destaque um movimento pouco percebido no mundo do projeto profissional e da engenharia: uma apreciação renovada pelo trabalho braçal, ou pela inovação com a ajuda de mãos humanas.
"Diversas pessoas se perdem no mundo da simulação em computador", diz Bill Burnett, diretor executivo do programa de projeto de produtos na Universidade Stanford. "Tudo é passível de simulação".
"Usar computadores para modelar o mundo físico se tornou cada vez mais comum; produtos tão diferentes quanto automóveis e aviões, remédios e celulares são quase inteiramente concebidos, especificados e projetados em telas de computador. Normalmente, apenas quando essas criações estão quase prontas para a produção em massa é que protótipos são produzidos, e muitas vezes não pelas pessoas que os projetaram.
Os projetistas e engenheiros mais criativos estão se rebelando contra essa alienação com respeito ao mundo físico. "Trabalhar com as mãos na massa é, para mim, parte crítica da compreensão de como conduzir o trabalho de projeto", diz Michael Kuniavsky, consultor em San Francisco que, por três anos, vem promovendo uma reunião de verão entre alguns dos mais renomados designers norte-americanos, conhecida como Sketching in Hardware.
Na sessão do ano passado, na Rhode Island School of Design, os participantes se dividiram em pequenos grupos, se equiparam com ferros de soldar e trabalharam com materiais que provavelmente eram mais conhecidos de seus avós do que deles.
Essas experiências refinam o instinto e a intuição, em oposição à lógica e ao conhecimento racional, dizem seus proponentes, e aproximam os projetistas mais da arte que da ciência.
"Eu não estou certo de que os empregadores reconheçam até que ponto o uso das mãos no trabalho é importante", disse Kuniavsky.
Gough começou a apreciar as possibilidades da idéia de "aprender fazendo" que Tulley implementou na Adobe depois que seus filhos fizeram o curso da Tinkering School.
Parte da resistência empresarial a experimentar atividades manuais surgiu da dificuldade de medir o valor de pagar os funcionários por, digamos, construir um kart ou um aparelho de rádio durante seu horário de trabalho. Mas os educadores afirmam que os benefícios da idéia, ainda que intangíveis, são evidentes. "Nem toda a inteligência humana se concentra no cérebro", diz Burnett. "Você aprende com suas mãos".
Em Stanford, a redescoberta das mãos humanas surgiu em parte pela frustração dos professores de engenharia, arquitetura e design, que perceberam que seus melhores alunos jamais haviam desmontado uma bicicleta ou construído um aeromodelo. Por mais ou menos a mesma razão, o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) oferece um curso chamado "como fazer (quase) tudo", que enfatiza o aprendizado necessário a utilizar ferramentas físicas de maneira efetiva.
Paradoxalmente, o anseio por tomar do martelo - ou o osciloscópio - pode se aprofundar à medida que os jovens se aprofundam mais e mais nos mundos simulados. "As pessoas passam tempo em seus mundos digitais que isso cria um apetite pelo mundo físico", diz Dale Dougherty, executivo da O'Reilly Media, de Sebastopol, Califórnia. Ele edita uma revista, Maker, cujo tema é a construção de equipamento na era digital.
Há 50 anos, mexer com engenhocas era atividade rotineira para as pessoas que se sentiam atraídas pela engenharia e pelo trabalho como inventores. Quando os computadores pessoais começaram a se generalizar, nos anos 80, "nós desenvolvemos a tendência de esquecer a importância dos sentidos físicos", diz Richard Sennett, sociólogo da London School of Economics.
Produzir refinamentos técnicos em um aparelho com as próprias mãos, em lugar de automaticamente como nos acostumamos a ver com os computadores, significa que "a pessoa precisa ser extremamente autocrítica", afirma Sennet, cujo livro The Craftsman o artesão examina a importância do "trabalho braçal capacitado", uma área que ele acredita abarque a programação de computadores.
Mesmo em campos altamente abstratos, como o projeto de circuitos eletrônicos de próxima geração, algumas pessoas acreditam que experiências manuais diretas podem reforçar a criatividade. "As mãos são necessárias para verificar experimentalmente uma tecnologia que não existe", diz Marco Paniccia, diretor do laboratório de tecnologia fotônica da Intel, em Santa Clara, Califórnia. Construir comutadores ópticos com material de silício, por exemplo, requer que os engenheiros testem os comutadores experimentais por conta própria, e que construam os equipamentos usados nos testes, além disso.
Recolocar as mãos humanas em uso no mundo do design digital pode ter conseqüências profundas em longo prazo. Os projetos podem se tornar mais seguros, mais simples de usar e até mesmo mais duráveis.
No mínimo, o processo de criar coisas deve se tornar mais divertido para as pessoas envolvidas. Embora trabalhar em mundos de computação simulados tenha atrativos inegáveis, afirma Tulley, "o ato físico de construir coisas ajuda à pessoa como um todo".
Tradução: Paulo Migliacci ME
Agora, Tulley faz a mesma coisa com dezenas de adultos que ocupam posições de destaque na criação de software para a Adobe, uma grande produtora de software de San Jose, Califórnia. Em oficinas de um dia de duração, cerca de 100 programadores da Adobe trabalham com contas plásticas, pequenas telas eletrônicas, copos de água da Ikea e pequenos sensores, com o objetivo de criar jogos que usam formas estranhas de movimento. Geralmente, a única coisa que essas pessoas tocam, em seu trabalho, é o mouse do computador.
"Algumas pessoas viram essa idéia como loucura de nossa parte", diz Michael Gough, vice-presidente de projeto da Adobe. "Mas, para alguns outros participantes, a experiência começou a influenciar a maneira pela qual eles trabalham", dando-lhes uma melhor apreciação da maneira pela qual os usuários experimentam os programas da Adobe.
"Por isso, vamos continuar levando essa idéia em frente", acrescentou. A transformação promovida por Tulley coloca em destaque um movimento pouco percebido no mundo do projeto profissional e da engenharia: uma apreciação renovada pelo trabalho braçal, ou pela inovação com a ajuda de mãos humanas.
"Diversas pessoas se perdem no mundo da simulação em computador", diz Bill Burnett, diretor executivo do programa de projeto de produtos na Universidade Stanford. "Tudo é passível de simulação".
"Usar computadores para modelar o mundo físico se tornou cada vez mais comum; produtos tão diferentes quanto automóveis e aviões, remédios e celulares são quase inteiramente concebidos, especificados e projetados em telas de computador. Normalmente, apenas quando essas criações estão quase prontas para a produção em massa é que protótipos são produzidos, e muitas vezes não pelas pessoas que os projetaram.
Os projetistas e engenheiros mais criativos estão se rebelando contra essa alienação com respeito ao mundo físico. "Trabalhar com as mãos na massa é, para mim, parte crítica da compreensão de como conduzir o trabalho de projeto", diz Michael Kuniavsky, consultor em San Francisco que, por três anos, vem promovendo uma reunião de verão entre alguns dos mais renomados designers norte-americanos, conhecida como Sketching in Hardware.
Na sessão do ano passado, na Rhode Island School of Design, os participantes se dividiram em pequenos grupos, se equiparam com ferros de soldar e trabalharam com materiais que provavelmente eram mais conhecidos de seus avós do que deles.
Essas experiências refinam o instinto e a intuição, em oposição à lógica e ao conhecimento racional, dizem seus proponentes, e aproximam os projetistas mais da arte que da ciência.
"Eu não estou certo de que os empregadores reconheçam até que ponto o uso das mãos no trabalho é importante", disse Kuniavsky.
Gough começou a apreciar as possibilidades da idéia de "aprender fazendo" que Tulley implementou na Adobe depois que seus filhos fizeram o curso da Tinkering School.
Parte da resistência empresarial a experimentar atividades manuais surgiu da dificuldade de medir o valor de pagar os funcionários por, digamos, construir um kart ou um aparelho de rádio durante seu horário de trabalho. Mas os educadores afirmam que os benefícios da idéia, ainda que intangíveis, são evidentes. "Nem toda a inteligência humana se concentra no cérebro", diz Burnett. "Você aprende com suas mãos".
Em Stanford, a redescoberta das mãos humanas surgiu em parte pela frustração dos professores de engenharia, arquitetura e design, que perceberam que seus melhores alunos jamais haviam desmontado uma bicicleta ou construído um aeromodelo. Por mais ou menos a mesma razão, o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) oferece um curso chamado "como fazer (quase) tudo", que enfatiza o aprendizado necessário a utilizar ferramentas físicas de maneira efetiva.
Paradoxalmente, o anseio por tomar do martelo - ou o osciloscópio - pode se aprofundar à medida que os jovens se aprofundam mais e mais nos mundos simulados. "As pessoas passam tempo em seus mundos digitais que isso cria um apetite pelo mundo físico", diz Dale Dougherty, executivo da O'Reilly Media, de Sebastopol, Califórnia. Ele edita uma revista, Maker, cujo tema é a construção de equipamento na era digital.
Há 50 anos, mexer com engenhocas era atividade rotineira para as pessoas que se sentiam atraídas pela engenharia e pelo trabalho como inventores. Quando os computadores pessoais começaram a se generalizar, nos anos 80, "nós desenvolvemos a tendência de esquecer a importância dos sentidos físicos", diz Richard Sennett, sociólogo da London School of Economics.
Produzir refinamentos técnicos em um aparelho com as próprias mãos, em lugar de automaticamente como nos acostumamos a ver com os computadores, significa que "a pessoa precisa ser extremamente autocrítica", afirma Sennet, cujo livro The Craftsman o artesão examina a importância do "trabalho braçal capacitado", uma área que ele acredita abarque a programação de computadores.
Mesmo em campos altamente abstratos, como o projeto de circuitos eletrônicos de próxima geração, algumas pessoas acreditam que experiências manuais diretas podem reforçar a criatividade. "As mãos são necessárias para verificar experimentalmente uma tecnologia que não existe", diz Marco Paniccia, diretor do laboratório de tecnologia fotônica da Intel, em Santa Clara, Califórnia. Construir comutadores ópticos com material de silício, por exemplo, requer que os engenheiros testem os comutadores experimentais por conta própria, e que construam os equipamentos usados nos testes, além disso.
Recolocar as mãos humanas em uso no mundo do design digital pode ter conseqüências profundas em longo prazo. Os projetos podem se tornar mais seguros, mais simples de usar e até mesmo mais duráveis.
No mínimo, o processo de criar coisas deve se tornar mais divertido para as pessoas envolvidas. Embora trabalhar em mundos de computação simulados tenha atrativos inegáveis, afirma Tulley, "o ato físico de construir coisas ajuda à pessoa como um todo".
Tradução: Paulo Migliacci ME
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